Etnografia do Planalto Beirão

Silva, José Manuel Azevedo e

Lá do alto da Torre, dos píncaros da Lapa ou do pico do Caramulinho, apuremos a imaginação, espraiemos o olhar e tentemos perscrutar a realidade do Planalto Beirão: espaço oblongo, delimitado por sobranceiras serranias, rasgado pelo Mondego e pelo Dão, com seus afluentes e subafluentes. Quase coincide com a Região Demarcada do Vinho do Dão. Era a terra do engenho, do mangual e da seitoira.
Em termos socioculturais, após a Segunda Guerra Mundial e em poucas décadas, tudo mudou neste espaço marcadamente rural. Mudaram as formas de produção, as alfaias agrícolas e as domésticas, os tipos de alimentação e de vestuário, os meios de transporte, as mentalidades, a ocupação dos tempos livres, os feitiços, as crendices, as superstições. Quer isto dizer que, na vivência quotidiana, as tradições, os usos e costumes de então caíram em desuso. E tudo o que deixa de ser usado, que perde a sua funcionalidade, transforma-se em elemento etnográfico. E tende a desaparecer sem deixar rasto, se não for preservado de forma museológica, imagética ou descritiva.
Tais mutações explicam-se pela acção de factores exógenos que gradualmente foram entrando nestes meios rurais. Foi chegando e electricidade, o telefone, a rádio, a televisão e, numa segunda vaga, o telemóvel, o computador, a internete. Os nossos povoados rurais deixaram de ser “mundos” isolados. O Mundo passou a entrar-lhes diariamente pela casa adentro.